"La dificultad no debe ser un motivo para desistir sino un estímulo para continuar"

Compra el disco de Paqui Sánchez

Disfruta de la música de Paqui Sánchez donde quieras y cuando quieras comprando su disco.

Puedes comprar el disco Óyelo bien de Paqui Sánchez Galbarro de forma segura y al mejor precio.

O tio Vania - Anton Tchékhov

O Tio Vânia ANTON TCHÉKHOV O Tio Vânia Cenas da vida no campo Peça em quatro actos Tradução de António Pescada Anton Tchékhov 6 O Tio Vânia 7 A tradução aqui publicada foi encomendada para a criação estreada no Teatro Carlos Alberto – Porto, no dia 10 de Novembro de 2005: O Tio Vânia de ANTON TCHÉKHOV Tradução ANTÓNIO PESCADA Encenação e cenografi a NUNO CARINHAS Figurinos BERNARDO MONTEIRO Desenho de luz NUNO MEIRA Desenho de som MIGUEL ÂNGELO SILVA Fotografi a pano de terra PAULA BENITO Preparação vocal e elocução JOÃO HENRIQUES Elenco ALEXANDRA GABRIEL Sofi a Aleksándrovna (Sónia) EMÍLIA SILVESTRE Elena Andréievna ISABEL ALVES COSTA Maria Vassílievna Voinítskaia JOÃO CARDOSO Ivan Petróvitch Voinítski (Vânia) JOÃO PEDRO VAZ Mikhaíl Lvóvitch Astrov JORGE MOTA Iliá Ilitch Teléguin JORGE PINTO Aleksándr Vladímirovitch Serebriakov PAULO FREIXINHO Empregado ROSA QUIROGA Marina Co-produção ASSÉDIO, ENSEMBLE – SOCIEDADE DE ACTORES, TNSJ Anton Tchékhov 8 O Tio Vânia 9 Personagens SEREBRIAKOV, ALEKSÁNDR VALDÍMIROVITCH, professor reformado ELENA ANDRÉIEVNA, sua mulher, de 27 anos. SOFIA ALEKSÁNDROVNA (SÓNIA), sua fi lha do primeiro casamento. VOINÍTSKAIA, MARIA VASSÍLIEVNA, viúva de um conselheiro, mãe da primeira mulher do professor. VOINÍTSKI, IVAN (VÂNIA) PETRÓVITCH, fi lho dela. ASTROV, MIKHAÍL LVÓVITCH, médico. TELÉGUIN, ILIÁ ILITCH, latifundiário empobrecido. MARINA, velha ama. EMPREGADO. A acção decorre na propriedade de Serebriakov. Anton Tchékhov 10 O Tio Vânia 11 PRIMEIRO ACTO Jardim. Vê-se uma parte da casa com terraço. Na alameda, sob os velhos álamos, há uma mesa posta para o chá. Bancos, cadeiras; sobre um dos bancos está pousada uma guitarra. Perto da mesa há um baloiço. Passa das duas horas da tarde. O céu está nublado. Marina (uma velha balofa e pesadona, sentada junto do samovar, faz croché) e Astrov (caminha ao pé dela). MARINA (Enchendo um copo.) Vem comer, meu querido. ASTROV (Aceita involuntariamente o copo.) Não tenho vontade. MARINA Bebes talvez uma pinga de vodca? ASTROV Não. Eu não bebo vodca todos os dias. Além disso o tempo está abafado. Pausa. Ama, há quanto tempo nos conhecemos? Anton Tchékhov 12 MARINA (Refl ectindo.) Quanto tempo? Queira Deus que eu me lembre... Tu vieste para cá, para esta região... quando foi?... Vera Petrovna, a mãe de Sónia, ainda era viva. No tempo dela vieste para cá dois invernos... Bem, quer dizer que passaram uns onze anos. (Depois de pensar um pouco.) Ou talvez mais... ASTROV Eu mudei muito desde esse tempo? MARINA Muito. Nesse tempo eras jovem, bonito, e agora estás velho. E a tua beleza já não é o que era. Ainda por cima bebes vodca. ASTROV Pois é... Em dez anos tornei-me outro homem. E qual é a razão? Trabalhei de mais, ama. Sempre a pé de manhã à noite, não tenho sossego. E à noite está uma pessoa debaixo do cobertor com receio de que o venham chamar para um doente. Em todo este tempo, desde que nos conhecemos, não tive um único dia livre. Como não envelhecer? E a vida é em si mesma aborrecida, estúpida, suja... Esta vida é opressiva. À nossa volta só vemos tipos esquisitos, só tipos esquisitos por todo o lado; um homem vive com eles dois ou três anos e pouco a pouco, sem dar por isso, torna-se também esquisito. Destino fatal. (Torce o longo bigode.) Ih, que grande bigode me cresceu... Bigode estúpido. Tornei-me esquisito, ama... Estúpido ainda não estou, graças a Deus, o cérebro continua no seu lugar, mas os sentidos estão como que embotados. Não quero O Tio Vânia 13 nada, não preciso de nada, não gosto de ninguém... Se calhar só gosto de ti. (Dá-lhe um beijo na cabeça.) Em criança tinha uma ama assim, como tu. MARINA Não queres comer? ASTROV Não. Há duas semanas, durante a Quaresma, fui a Málitskoie por causa de uma epidemia... Tifo... As pessoas estão todas doentes nas isbas... Lama, fedor, fumo, os bezerros pelo chão junto com os doentes... Os porcos também por ali... Andei o dia inteiro ocupado, sem me sentar, sem comer nada, e chego a casa não me dão descanso — trouxeram-me um agulheiro do caminho de ferro; deitei-o na marquesa para o operar, e ele vai e morre-me com o clorofórmio. E quando não deviam, os meus sentidos despertaram e a consciência começou a apertar-me, como se eu o tivesse morto de propósito... Sentei-me, fechei os olhos — e fi quei a pensar: aqueles que viverem daqui por cem ou duzentos anos e para quem abrimos hoje o caminho, irão lembrar-se de nós com uma boa palavra? Não lembram, ama! MARINA As pessoas não se lembram, mas Deus lembra-se. ASTROV Pois obrigado. Dizes muito bem. Entra Voinítski. Anton Tchékhov 14 VOINÍTSKI (Vindo da casa; adormeceu depois do almoço e tem um aspecto amarrotado; senta-se num banco, endireita a sua elegante gravata.) Sim... Pausa. Sim... ASTROV Dormiste bem? VOINÍTSKI Dormi... muito. (Bocejando.) Desde que o professor vive aqui com a mulher, a vida saiu dos eixos... Durmo fora de horas, ao almoço e ao jantar como toda a espécie de mistelas, bebo vinho... tudo isto faz mal à saúde! Dantes não tinha um minuto livre, eu e a Sónia trabalhávamos, e trabalhávamos bem, e agora só a Sónia trabalha, e eu durmo, como, bebo... Não está certo! MARINA (Abanando a cabeça.) Que hábitos! O professor levanta-se ao meio-dia e o samovar está a ferver desde manhã, à espera dele. Quando eles não estavam cá almoçávamos sempre à uma hora, como as pessoas fazem em todo o lado, e com eles é depois das seis. À noite o professor lê e escreve, e de repente às duas horas toca a campainha... Que há, senhor? Chá! Por causa dele é preciso acordar o cozinheiro, acender o samovar... Que hábitos! ASTROV E ainda vão fi car aqui muito tempo? O Tio Vânia 15 VOINÍTSKI (Assobiando.) Cem anos. O professor decidiu instalar-se aqui. MARINA Ainda agora. Há já duas horas que o samovar está na mesa e eles foram passear. VOINÍTSKI Lá vêm, lá vêm... Não te preocupes. Ouvem-se vozes; do fundo do jardim, regressando do passeio, caminham Serebriakov, Elena Andréievna, Sónia e Teléguin. SEREBRIAKOV Excelente, excelente... Umas vistas maravilhosas. TELÉGUIN Magnífi cas, Excelência. SÓNIA Amanhã vamos à fl oresta, papá. Queres? VOINÍTSKI Senhores, vamos tomar o chá! SREBRIAKOV Meus amigos, mandem-me o chá ao escritório, por favor! Preciso de fazer uma coisa ainda hoje. SÓNIA De certeza vais gostar de ir à fl oresta... Anton Tchékhov 16 Elena Andréievna, Serebriakov e Sónia entram na casa; Teléguin dirige-se para a mesa e senta-se ao lado de Marina. VOINÍTSKI Está um calor abafado mas o nosso grande cientista anda de sobretudo, galochas, guarda-chuva e de luvas. ASTROV Quer dizer que se protege. VOINÍTSKI E ela é tão bonita! Tão bonita! Nunca na minha vida vi mulher mais bonita. TELÉGUIN Eu, Marina Timoféievna, quando vou a cavalo pelo campo ou passeio à sombra do jardim, ou olho para esta mesa, sinto uma inexprimível felicidade! O tempo está lindo, há pássaros a cantar, nós vivemos em paz e harmonia — que mais queremos? (Pegando no copo.) Muito agradecido! VOINÍTSKI (Sonhador.) Aqueles olhos... Mulher maravilhosa! ASTROV Conta qualquer coisa, Ivan Petróvitch. VOINÍTSKI (Com indolência.) Contar-te o quê? O Tio Vânia 17 ASTROV Não há nada de novo? VOINÍTSKI Nada. É tudo velho. Eu sou o mesmo que era, tornei- -me talvez pior, porque fi quei preguiçoso, não faço nada e ando sempre a resmungar como um velho rezingão. A minha velha gralha, a maman, continua a palrar acerca da emancipação das mulheres; está com um olho na cova, mas com o outro procura nos seus livros eruditos o alvorecer de uma nova vida. ASTROV E o professor? VOINÍTSKI O professor fi ca sentado de manhã à noite no seu escritório a escrever. «A mente tensa, a testa franzida, escrevemos odes, escrevemos, e elogios a elas ou a nós, não os ouvimos nem os vemos.»1 Pobres papéis! Era melhor que ele escrevesse a sua autobiografi a. Que excelente tema, esse! Um professor reformado, compreendes, um velho áspero, um bacalhau erudito... Gota, reumatismo, enxaqueca, com o fígado inchado de ciúme e de inveja... Esse bacalhau vive na propriedade da sua primeira mulher, contrariado porque não lhe chega a bolsa para viver na cidade. Sempre a queixar-se das suas desgraças, embora no fundo seja invulgarmente feliz. (Nervosamente.) Vê lá tu que sorte! Filho de um simples sacristão, seminarista, 1 Versos do poeta Dmitriev (1760-1837). (N.T.) Anton Tchékhov 18 alcançou grau científi co e uma cátedra, tornou-se Sua Excelência, depois senador, etc., etc. De resto nada disso é importante. Mas repara nisto. Durante vinte e cinco anos um homem lê e escreve sobre arte sem perceber nada de arte. Durante vinte e cinco anos remói ideias alheias sobre o realismo, o naturalismo e todas essas tolices; durante vinte e cinco anos lê e escreve sobre coisas que as pessoas inteligentes já sabem há muito tempo e de que os tolos não querem saber — quer dizer, vinte e cinco anos a despejar do oco para o vazio. E ao mesmo tempo que presunção! Que pretensões! Reformou-se e ninguém o conhece, é um perfeito desconhecido; quer dizer que durante vinte e cinco anos ocupou um lugar que não era dele. Mas olha: caminha como um semideus! ASTROV Ora, tu parece que tens inveja. VOINÍTSKI Sim, tenho inveja! E que sucesso com as mulheres! Nenhum Don Juan teve um sucesso tão completo! A primeira mulher, minha irmã, uma criatura excelente, dócil, pura como este céu azul, nobre, generosa, que tinha mais pretendentes do que ele tinha alunos, amava-o como só os anjos puros podem amar outros anjos tão puros e belos como eles. A minha mãe, sogra dele, ainda hoje o adora e ainda hoje ele lhe inspira um medo sagrado. A segunda mulher, uma beldade, inteligente — acabam de vê-la agora mesmo — casou-se com ele já velho, entregou-lhe a sua juventude, a beleza, a liberdade, o seu brilho. Para quê? Porquê?

Compartir en redes sociales

Esta página ha sido visitada 135 veces.